terça-feira, 25 de janeiro de 2011

um estranho


Uma dor no peito sufocante. Era o que sentia. Sua angústia afetara os sentidos de percepção e o deixara um tanto perturbado. Seus olhos percorriam todos os corredores possíveis, aflitos buscavam alguma coisa, mas nada que lhes fosse sabido. Era algo que ainda não identificara. Tinha pressentimentos e uma inquietude que lhe tomava por paranóico. Tinha certeza, algo o esperava...
Comprou uma bebida e antes que virasse o rosto olhou espontaneamente, até intuitivamente para trás e viu um homem alto, de olhos verdes, cabelos grisalhos e de bondosa expressão, porém de aparência um tanto astuta. Era um velho conhecido, mas foi o prazo de pegar a bebida e se virar, que logo sumira sem deixar vestígios. Tal situação o deixara um tanto quanto intrigado. Procurou o homem com toda voracidade. Olhou por todas as saídas e laterais do prédio. Revisitou o lugar onde comprara a bebida e saiu novamente, deu uma grande volta e nada... Pensava no quão estranha fora a situação, o pior era o fato de aquele amigo o ter visto, pois sempre que o vira ia a seu encontro contente cumprimentá-lo. Não foi o que aconteceu dessa vez, muito pelo contrário, saiu sorrateiro crédulo de que não fora notado, isso lhe causara estranheza.
Logo em seguida encontrou uma pessoa que veio lhe falar, mas estava tão pensativo no ocorrido que se quer dera ouvidos. Pediu desculpas e sentou-se no saguão onde uma vista privilegiava toda e qualquer movimentação de pessoas. Repousou as duas mãos sobre as pernas em uma posição atenta para todos os ângulos, mas com certo grau de precaução pelas costas, isso quando não girava o pescoço e o tronco freneticamente em varias direções. As horas foram passando, logo se cansou de montar guarda e decidiu ir para casa.
Seus olhos refletidos nas janelas daquele ônibus escuro deixavam o horizonte de luzes misturarem-se com a quase inexistência de sua imagem. O torpor daqueles fatos que o deixara confuso e ávido por uma resposta o fez lembrar-se de que dias atrás desejou ficar invisível a todos, pois não sabia lidar mais com a presença humana... Era como se não o fosse também. Passava dias a se esgueirar por lugares escuros e isolados para que ninguém o visse. Tinha um cantinho onde se refugiava de todos e pedia para que aqueles instantes durassem eternamente, pois se sentia atormentado em presença alheia, achava um incômodo mútuo compartilhar de sua patética existência.
Desceu do ônibus, uma rua deserta ilustrava sua fúnebre expectativa. Caminhando a longos passos perdia o rosto no escuro e como em uma pintura oculta revelava-se pela pouca iluminação do poste o sombreado de um rosto atormentado que se quer reconhecera a própria sombra desengonçada o acompanhando. Sua marcha o fizera perder-se em si e o caminho tornara muito vasto, sentia-se um estranho para si mesmo e um medo do externo deslocou-se para dentro e agora ele fluía o inverso. Ficar só com sigo mesmo se tornara apavorante, foi nas profundezas de seus pensamentos que seus passos no asfalto começaram a parecer mais distantes, a luz que sombreava seu rosto se tornou nostálgica e também cada vez mais distante, estava se esvaindo para dentro, era uma implosão lenta e contínua.

2 comentários:

  1. Parabéns, gostei muito.

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  2. Gostei muito do seu texto, Kris. Denso, profundo e simplesmente encantador. Gostei da maneira como você se remete aos sentimentos do personagem-narrador de forma que a gente, ao menos eu fiquei, fique plenamente afeiçoado a situação e angustia.

    Parabéns!

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