quinta-feira, 3 de março de 2011

dor e cores


Precipitei com o olhar a chuva. Ela ia com o vento a lamber meu rosto. E no fim, um arco-íris surgiu no canto de meus lábios.


Pude ver o quão impossível é ressequir o úmido da dor, mas que, provavelmente, no fim dela exista algo interessante e doce a esperar. Sim, pois não haveria a beleza de tais cores a enfeitar o céu caso não houvesse partículas lacrimosas de cristais.
Se há cores é porque também houve dores. Deve isso ser algum traço inerente ao humano. No entanto, pressinto uma leve beleza de alma nos que choram e, audaciosamente, permite-lhes brotar um sorriso.

Não seria a felicidade euforia alguma. Apesar da explosão de cores, o arco-íris é sereno. Seria então um momento de calma e bem estar após qualquer tempestade. E a verdadeira felicidade vale a dor!

Nesse caso, poderia fazer uma adaptação de uma célebre frase do grande poeta Fernando Pessoa, dizendo, “A lágrima vale a pena quando a alma não é pequena”.

Preciso segredar-lhes algo. Há, todos os dias, um arco-íris em mim!

terça-feira, 25 de janeiro de 2011

um estranho


Uma dor no peito sufocante. Era o que sentia. Sua angústia afetara os sentidos de percepção e o deixara um tanto perturbado. Seus olhos percorriam todos os corredores possíveis, aflitos buscavam alguma coisa, mas nada que lhes fosse sabido. Era algo que ainda não identificara. Tinha pressentimentos e uma inquietude que lhe tomava por paranóico. Tinha certeza, algo o esperava...
Comprou uma bebida e antes que virasse o rosto olhou espontaneamente, até intuitivamente para trás e viu um homem alto, de olhos verdes, cabelos grisalhos e de bondosa expressão, porém de aparência um tanto astuta. Era um velho conhecido, mas foi o prazo de pegar a bebida e se virar, que logo sumira sem deixar vestígios. Tal situação o deixara um tanto quanto intrigado. Procurou o homem com toda voracidade. Olhou por todas as saídas e laterais do prédio. Revisitou o lugar onde comprara a bebida e saiu novamente, deu uma grande volta e nada... Pensava no quão estranha fora a situação, o pior era o fato de aquele amigo o ter visto, pois sempre que o vira ia a seu encontro contente cumprimentá-lo. Não foi o que aconteceu dessa vez, muito pelo contrário, saiu sorrateiro crédulo de que não fora notado, isso lhe causara estranheza.
Logo em seguida encontrou uma pessoa que veio lhe falar, mas estava tão pensativo no ocorrido que se quer dera ouvidos. Pediu desculpas e sentou-se no saguão onde uma vista privilegiava toda e qualquer movimentação de pessoas. Repousou as duas mãos sobre as pernas em uma posição atenta para todos os ângulos, mas com certo grau de precaução pelas costas, isso quando não girava o pescoço e o tronco freneticamente em varias direções. As horas foram passando, logo se cansou de montar guarda e decidiu ir para casa.
Seus olhos refletidos nas janelas daquele ônibus escuro deixavam o horizonte de luzes misturarem-se com a quase inexistência de sua imagem. O torpor daqueles fatos que o deixara confuso e ávido por uma resposta o fez lembrar-se de que dias atrás desejou ficar invisível a todos, pois não sabia lidar mais com a presença humana... Era como se não o fosse também. Passava dias a se esgueirar por lugares escuros e isolados para que ninguém o visse. Tinha um cantinho onde se refugiava de todos e pedia para que aqueles instantes durassem eternamente, pois se sentia atormentado em presença alheia, achava um incômodo mútuo compartilhar de sua patética existência.
Desceu do ônibus, uma rua deserta ilustrava sua fúnebre expectativa. Caminhando a longos passos perdia o rosto no escuro e como em uma pintura oculta revelava-se pela pouca iluminação do poste o sombreado de um rosto atormentado que se quer reconhecera a própria sombra desengonçada o acompanhando. Sua marcha o fizera perder-se em si e o caminho tornara muito vasto, sentia-se um estranho para si mesmo e um medo do externo deslocou-se para dentro e agora ele fluía o inverso. Ficar só com sigo mesmo se tornara apavorante, foi nas profundezas de seus pensamentos que seus passos no asfalto começaram a parecer mais distantes, a luz que sombreava seu rosto se tornou nostálgica e também cada vez mais distante, estava se esvaindo para dentro, era uma implosão lenta e contínua.

segunda-feira, 17 de janeiro de 2011

hoje...



Talvez só por hoje precisaria do seu humor ácido, porque amanhã precisarei da sua perspicácia e doce atenção. Não é uma questão hipocrática, esse sentimento tolo que me invade e deturpa o que sinto, sobre você e eu. Só quero um espaço momento para me ater as minhas obrigações, mas é muito gratificante prender sua atenção.
Escute com calma, hoje desacordei alguns sentimentos e outros que repousavam ressurgiram sem pedir minha aprovação. Eles me exigiram, e exigiram de mim a busca de algumas coisas. Coisas aqui trato por promessas que fiz a mim mesma. São coisas que abandonei e segui outras coisas que não eram prometíveis. Bom, te digo ainda que meus sonhos são grandes demais e as vezes de tão incomensuráveis me sinto tragada por eles. Certa vez ouvi dizer que sonhos que não perseguimos, acabam por nos perseguir. E hoje eu me sinto perseguida por uma quantidade de sonhos que abandonei dentro de mim. Sonhos que adormeceram. Sonhos que eu simplesmente achei que não fossem importantes. Eles me acordam de dia e me perseguem nas esquinas dos meus pensamentos noturnos, inundam meus oceanos de sonhos, que por instantes não se tornam pesadelos. Por vezes temo ser tragadas por minhas inclinações, porque são tantas. E tantas delas se bifurcam em sentidos opostos, são caminhos que se distanciam uns dos outros e às vezes parecem se encontrar no meu desassossego e, em minha inquietação.
Sabe quando você se vê diante de uma pequena estrada que se abre em duas? Em que o da direita é feito de arco-íris e o outro de tijolinhos amarelos? As duas trazem promessas de aventuras e de maravilhas, claro que com alguns pesares, mas nada que não se finde na anulação da outra. Então você para e pensa, se eu seguir uma, necessariamente teria de abandonar a outra, e vice e versa. Por medo de se lançar a qualquer um dos dois caminhos, você simplesmente vira as costas e segue outra direção, uma de estrada de concreto, pra não correr o risco de repentinamente se ver frente à Narnia. Mais a frente, digo do tempo e do caminho, mesmo com aparição de cabelos brancos as reminiscências lhe trazem o gosto e o cheiro daqueles caminhos tão atual como se fosse ontem ou há alguns minutos que você os abandonou, e você sente que não consegue esquecê-los.  É fácil pensar que se poderia ter simplesmente dado alguns passos e de olhos fechados escolher, mas isso talvez não impedisse de lhe trazer as narinas o cheiro e talvez o arrependimento de não ter optado pelo outro. Por fim, eu encerro esse devaneio por aqui... sim, largado, sem de fato concluir alguma coisa... por favor, não se queixe... foi só uma divagação curta, passou. Esta bem... prosseguirei, mas sem um grande final, somente um parágrafo grande, apertado e nada mais.
Bom, tenho pensando em caminhar por entre alguns lugares que induzam como num passe de mágica a minha intolerância aos meus sonhos e às pessoas que por eles passaram e os adornaram para me instigar. Poderia me bastar em satisfazer os olhos em sono REM, ao passo que continuo vivendo assim, sem grandes emoções. Devo exalar essência de mandrágora, pois os caminhos eu os adormeço, assim como quando a plantinha “dorme-dorme” desfalece ao toque de meus dedos. Quem sabe ao desvirar-me desse desavesso pensarei em correr atrás dessas inclinações, e como sempre digo “procuro vigiar minhas inclinações antes do entardecer dos meus dias”. Talvez hoje só viva aqui dentro mesmo. Talvez permaneça com a dúvida de como seria se tivesse vivido, talvez trace um novo caminho. O fato é que não podemos viver tudo que queremos. Isso nem importa, pois sempre há pessoas a caminhar. Hoje me contento com as pessoas que passam.