terça-feira, 28 de dezembro de 2010

sina, um novo caminho


Não andava assim, com as pernas tão firmes, desde que caminhos tortuosos se afastaram de meus passos e pude então sentir a firmeza do solo sob meus pés. O corpo já não me é tão leve, nem sequer tem no peso algo desconfortável, apenas uma sensação de existir ali. Esse foi um dos primeiros sinais para saber que não estava muito longe de alcançar a dignidade de simplesmente poder existir e estar em qualquer lugar onde estivesse.
Como um carpete persa, se estende diante de minha sombra no asfalto duas direções. Por um tempo contemplei e imaginava minha sombra vagando sem mim pelo caminho que quisesse. Ouvi vozes conhecidas, dentre elas uma que amei ouvir por muitos anos, a de um querido amigo. Seus olhos eram castanhos como a terra vermelha que acompanhava a larga estrada plana pelos dois lados. A sombra de suas sobrancelhas deixara sua feição mais séria e sóbria do que já era. E eu sabia o que trazia naquele olhar, ou melhor, o que levava... 
Por algum tempo cedeu de meus pulmões em lugar de todos os ares frescos e doces, um ar pesado que me fez tragar o ar novamente. Gil sabia o que aquilo significava. Mesmo assim seus olhos insistiam severamente. Quase que num desespero agarrei-me em minha mochila e tentei ser mais concisa possível. Gravei aquela face que amei ver durante todos esses seis anos e disse que não seguiria mais com eles. O ônibus parado baforou um ar quente em meu rosto, parecia ter surgido do nada naquele instante. Foi confuso. Somente vi suas sensíveis mãos segurando a porta e seu olhar fixo em mim.
Confesso ter sentido toda vontade do mundo de abandonar a minha sina e correr junto dele para onde todos seguiam, mas não, já estava decidida. Todos meus amigos subiram com olhares solenes, pude ouvir suas vozes no meio daquele silêncio cortado pelo som dos motores. As vozes eram felizes e pouco barulhentas, vinham do interior daquele ônibus. Alguns perguntavam a Gil, “e ela, não vem?” As vozes cessaram e agora os olhos dele tinham mais do que eu pudesse entender. Com um sorriso amarelo disse a ele que seguisse e que eu ficaria bem, guardei aquele rosto, virei e segui a pé. O caminho que escolhi era direção contrária da que ouvi distanciar o som do motor.
Minha escolha, minha sina é solitária, demorada, incerta...  temi ter errado muito, temi morrer naquele deserto. Perdi todas as minhas companhias, as deixei ir a sentido oposto, e por um veículo que os levariam cada vez mais rápido para longe de mim, num destino certo. Temi encontrar tempestades das quais não pudesse me apartar. Temi deparar-me com a eterna solidão ou mesmo com a loucura que me espreitava.
O vento generoso, como sempre, soprou-me uma brisa leve e o céu pintou-se de laranja e cor-de-rosa. Via brotar a beira da estrada flores amarelas. Aves me visitavam e seguiam-me alguns momentos. Muito vasto era o lençol de asfalto que se estendia e diante de meus olhos, parecia não ter fim. Não sei para onde me levará, tão pouco se cansarei antes do destino... O itinerário é árido, mas vejo beleza. Este é só o início, meus pés não se cansaram e estou a caminhar...




Um comentário:

  1. Às vezes devemos seguir os caminhos incertos para sentirmos a vida q antes era anestesiada por outras pessoas.

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